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quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Ponto-e-vírgula

Ivan LessaColunista da BBC Brasil

The Guardian é o jornal que eu leio de segunda a sábado. Foi fundado em 1821, vende por volta de 380 mil exemplares, pode ser rotulado de liberal com tendência esquerdista, que isso não é para envergonhar ninguém.
A publicação está entregue a um truste sem fins lucrativos. Trata-se do único jornal britânico inteiramente publicado a cores. Seu projeto gráfico, que tem menos de dez anos, vive ganhando prêmios nas agremiações especializadas nessas grafismologias.
O jornaleiro da porta da estação de metrô me vê e já vai sacando de um exemplar. Depois de uma troca de bons dias, e eu dar-lhe os devidos 80 pence (pouco menos de R$ 3), começo a folheá-lo.
Três são os editoriais na devida página par em que são publicados. Os dois primeiros cuidam dos assuntos que preocupam, ou deveriam preocupar, o cidadão comum. No terceiro, a coisa muda de figura.
Antecede seu título as palavras In praise of, seguidas de reticências, ou três pontinhos, que é mais simpático de chamar, e aquilo que, naquele dia, o editor resolveu que merecia ser louvado.
Deve ser o editorial que mais me interessa. Mais que as taxas bancárias, a situação no Iraque ou a corrida Obama-Clinton.
Deve ser – sei que é – difícil encontrar, seis vezes por semana, algo que mereça ter seus méritos enaltecidos.

Colon and semicolon
Um desses editoriais me despertou particular atenção na semana passada. Era em louvor do ponto-e-vírgula, ou, em inglês, o semicolon. Colon são os nossos dois-pontinhos.
Sempre quebrei a cara no ponto-e-vírgula. Os dois-pontinhos até que eu manejava com uma certa facilidade.
Para que vocês tenham uma idéia: confere? Já o ponto-e-vírgula tive professores e amigos letrados que me aconselhavam evitá-lo até onde possível.
Sou teimoso; este talvez seja um defeito meu. Exemplifiquei de novo. Terei acertado?
Dicionários básicos, de Houaiss a Aurélio, me informam que se trata de um sinal de pontuação que indica pausa mais forte que a vírgula e menor que o ponto final; indica (olha outrozinho aí) separação de orações absolutas que têm certa extensão, sobretudo se tais orações possuem partes já separadas por vírgula.
Faz sentido? Faz. Daí até a prática é um abismo.

O ponto-e-vírgula em nossa imprensa
Não sei como vai nossa imprensa em matéria de ponto-e-vírgula em seus editoriais, reportagens e colunas.
Na verdade, sei muito pouco a respeito de nossa imprensa, uma vez que para ler nossos três principais jornais (O Globo, Folha de São Paulo e Estado de São Paulo) eu teria que gastar uma pequena fortuna por mês; um dinheirinho que me faria falta para ser mais sincero.
Leio todos os jornais do mundo online de graça. De El País a Le Monde, passando por La Republicca e o New York Times (sim, eu sei, certos artigos para ler na íntegra você que tem que comparecer com uns cobres) até o Diário de Notícias português e o próprio The Guardian, para fechar o círculo.
Do Brasil, cadastrei-me no Jornal do Brasil e, todo dia, estou lá vendo – grátis, como um convidado de honra – o que vocês andam fazendo.
Em O Dia, acompanho, sem pagar ou me cadastrar, as andanças do ponto-e-vírgula (parece-me que tudo bem nos dois últimos citados) e a perplexidade do querido Jaguar que, até hoje, não chegou a dominar as firulas do travessão.
Revistas? Veja? Nem pensar. Isso é coisa de rico.
Não sei o porquê de nossos publishers em querer auferir tanto. Não bastarão os milhões de exemplares vendidos de cada título? Ou seus jornais andam vendendo mal, muito mal, para um país de mais de 160 milhões de habitantes?
Por falar em publisher: esse o nome que resolvemos, ou resolveram por nós (ou vocês aí), dar ao “dono da bola”. É engraçado sem ser vulgar.

Uma justa comemoração
No editorial do Guardian a que me referi, datado de 21 de fevereiro, Nova York vem comemorando o ponto-e-vírgula; um fato tão inesperado quanto digno de loas e vivas.
O New York Times (e eu fui lá, de graça, conferir) parabenizou a “mão acadêmica” que chegou-se a um cartaz público exposto no metrô nova-iorquino e corrigiu a frase seguinte, sugerindo como se desfazer de um jornal velho, “Por favor bote numa lata de lixo, isso é boa notícia para todos”, com uma simples troca de vírgula por ponto-e-vírgula.
O diário em questão lembrava que é uma péssima prática ligar duas sentenças por meio de uma mera vírgula. Que isso é coisa de semianalfabeto.
Quem souber de como vão as coisas com nossos pontos-e-vírgulas midiáticos, peço a fineza que me informe. Agradeço de antemão e antebraço também.

Conclusão
No mais, é como disse Alexander Pope, aquele do Paraíso Perdido: “Errar é humano; perdoar, divino”.

Um comentário:

beckman disse...

eu te perdoo. o paraíso perdido é de john milton